sexta-feira, 2 de janeiro de 2004


            Sinto medo deste inverno, que chega ao baile na hora em que tremo. Medo de perder o que nem sei se tenho. A estranheza chega-nos como uma cobra. Não faminta, mas sempre ameaçando dar seu bote.

       Depois de ver os olhos vazios, continuo procurando formas de preenchê-los sem espelhar esses fantasmas. Quero adivinhar-lhe os pensamentos, mas quais são os meus nessa mistura? Gostaria de dissolver-me em eternas palavras, mas cavando fundo até meus mais leves sentimentos, prefiro passar despercebida. Passar...
       Seria um alívio ver um dia de minha vida passar, mas tenho sentimentos que entopem seu escape e eu fico vivendo de novo. O mesmo dia que não passa.
       Tô de novo mendigando algo que dou de sobra. Nem precisava voltar ao meu cemitério astral e, no entanto, cá estou eu, presa às certezas acerca do amor, que são minha marcha fúnebre. Presa em um dia que é igual a todos os outros dias desamados. Pobres e tristes dias, abandonados em um cemitério tosco, sem receber visitas, senão as minhas, que sou sua prisioneira. Dias sem amor, pra que servem? O que são além de fantasmas esquecidos, mal queridos, passados? Invejam os dias de amor, que são eternos. E me aprisionam, pois é forma de existirem.
       Deixem-me passar! Quero fluir pra fora dessas horas inúteis, quero a vida útil dos que são amados.
Saio do cemitério, sei que de fora parece um circo. Dias cínicos, fingem que não aprisionam. Qualquer um que se livra de vocês quer fazê-lo correndo.
     Olho dentro destes mesmos olhos vazios, como poderiam ser a solução para alguma coisa? Parecem não ter vida nem para si, como podem me inspirar tanto amor e esperança? É daí que vem o escape para estes meus dias irônicos e doentinhos? Sinto medo deste inverno, muito medo.

Nanna Carolina 

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